Maria José Rijo
Não sou princípio - Nem fim! -Sou um ponto no caminho- Daquela linha partida- Que vinha de Deus para mim!
QUATRO EXCLAMAÇÕES
À Lá Minute
Jornal Linhas de Elvas
Nº 1804 – 20 de Setembro de 1985
São Mateus 1985
para saber entanguidos, e engadanhados de frio,
os dedos entorpecidos de articulações doloridas,
e nas botas empedernidas – mais duras do que torrões –
em que a terra se tornou, e onde se avança aos baldões,
com todas as intempéries…
-- os pés são pesos de chumbo…
-- É o Inverno, com chuvas, vento,trovões,
e geadas de rachar…
-- Ao proteger o gado, afrontando o temporal…
-- “Ah, vida dum filha da mãe!
Raio de tempo dum sacana!”
Desabafa o maioral!...
Quando a seara desponta, e só servem os sentidos
para atentar se é bem nascida (o que é o pão da vida)
de quem na terra trabalha…
-- Quando é a perder de vista
verde, verde, o que se avista…
-- Se a azeitona deu bem, e os lagares ainda gemem…
-- E o Fevereiro não veio quente (com o diabo no ventre).
-- Se de tudo há novidade na sezão em que era esperada…
-- Vendo de longe a mulher que veio espreitar à porta
para ver chegar o marido, o aguarda no umbral
-- Sorrindo – orelha a orelha,
acena com gesto largo…
“Olha lá pr’a este enlevo!
Disto não me lembro igual!
Vai um ano dum sacana!...
Diz a esperança que canta nas falas do maioral.
Quando o calor zumbe aos ouvidos, e só servem os sentidos
para ter medo de os perder…
-- Quando o ar que se respira parece estar a arder,
e a garganta e os pulmões se engasgam com o suão…
e, coitado, o coração bate apressadamente, aflito
como um pobre pardalito, fechado na mão de alguém!
-- Sem dar perdão a ninguém, a canícula avassala!
-- “É dura a vida dos pobres!
Ah! Calorina real
Raio de tempo dum sacana”
-- Desabafa e limpa o suor, ofegante o maioral!
Quando toda a safra acaba, e só servem os sentidos
para almejar uns festejos,
convívios com gente amiga que só se vê de ano a ano…
-- E o que lembra é um copo, uma cerveja fresquinha,
cantar umas brejeirices, largar umas baboseiras,
galhofar de tudo e nada…
reinventar a mocidade
(onde aparece que coube tudo o que se soube)
-- E a feira de São Mateus
-- Festas, jogo e arraiais!
e ao chegar à Piedade
-- Com o azeite da promessa – em prudência inteligente,
alinha os seus pensamentos,
(de joelhos – cheio de fiel ar beato - agradecido )
desfia o que a alma sente:
“Rezo pouco e cá p’ra mim!
Oh, meu Deus – não é por mal!
-- É que a gente tem pendência p’ra…
P’ra largar só asneiradas…”
Remedia ainda a tempo
bem contrito o maioral.
Maria José Rijo
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18 comentários
De Gustavo Frederich a 07.08.2008 às 01:20
a esta sua forma especialmente bela de se escrever.
Que posso dizer se estou fascinado...
Oh tia
Dois bons textos para juntar a tantos e tantos que já tem aqui publicados.
Realmente o Alentejo é uma das suas paixões, mais
o Baixo Alentejo, onde tem as suas raizes fundas, as
raizes da infância, essas que nos levam por aqueles
caminhos especiais da lembrança - não é tia?
Sinto na sua escrita esse seu intenço amor por esse
Alentejo (que eu conheço tão pouco) MAS que aqui
dá para entrar no seu - mais profundo sentido de
amor .
Obrigada Tia por mais estes textos.
Com um beijinho
Gus
De Luisinha a 07.08.2008 às 01:28
Passei para deixar um grande beijinhos de todos
nós para si.
A Mãe esteve a ler (de voz alta) os 2 textos e eu
vim escrever por todos e dizer que gostamos muito.
O Papy adora os textos do seu Alentejo, aliás é
um gosto de todos.
Tia, por muito empenho de minha abozinha vou
iniciar um curso de pericultura e hoje compramos
mais umas roupinhas.
Estou mais ligada que nunca a esta barriga que
está a crecer...
Muitos beijinhos tia
E a minha mãe contou-me que está a preparar
uma exposição. Não é?
Espero que esteja feliz.
Beizinhos
Luizinha
De maria Jose a 08.08.2008 às 23:05
Minha Menininha Querida
É bom, é muito bom reecontrá-la aqui a deixar comentários. Na verdade a Vida é poderosa e exigente, muito exigente com todos nós, e, enquanto se vive, cada dia , como cada passo faz parte do nosso percurso, do nosso irrecusável caminho, porque a exigência é essa. - Viver, e viver é ir em frente.
Fico feliz porque quer saber, melhor ainda, como receber a sua filha. Quanto tempo falta para ela chegar?É sempre bom estudar. Seja o que for. Agora puericultura, depois, outras coisas. Não pare. Não pare para não ficar para traz no tempo. Perdoe permitir-me falar-lhe assim. Mas,julgo certo dizer-lhe que acredito no povo quando diz que quando Deus fecha uma porta, sempre abre uma janela.
Então que não nos falte a fé para olhar para longe!
È verdade que estou a preparar uma exposição.
" Foi o que vi da janela que se me abriu...
Deverá ser a ultima.
O esforço já ultrapassa um pouco a minha resistência fisica.
Já me apetece não ter preocupações.
Muitos beijiinhos para todos - tia Zé
De Xavier Martins a 07.08.2008 às 01:31
sem sombra de dúvidas.
Aprecio bastante a sua forma de escrever, não é
muito comum encontrar blogs onde a escrita tenha
estas dimensões.
Aqui sim, e isso agrada-me e muito.
Seu muito admirador
Xavier Martins
De Maria José a 08.08.2008 às 23:17
Obrigada pela sua amizade e, pelas visitas a que ela o impele - muito origada.
Já conto com a sua presença como se conta com um familiar.
Vivo muito só. A solidão é também como uma segunda pele. Veste-se, adapta-se a nós e, nós a ela.
A Paula, minha sobrinha de coração, inventou esta forma de me readaptar ao convívio com o mundo.
Eu, concordei. Agora, tal como cada um de vós, também eu me surpreendo por vezes com escritos que já esquecera. Só que o Turismo e os familiares ocupam-lhe muito tempo e, só a sua dedicação e amizade conseguem "estes milagres".
Um abraço maria José
De Ana Maria Lourenço a 07.08.2008 às 11:15
Claro que me agradou, na realidade são todos
muito bons.
Os meus sinceros Parabéns pelo Blog e pela forma
como é feito e principalmente, por si, Maria José
que escreve desta forma sublime, que tanto me
encanta.
Com muita admiração
Ana Maria
De Maria José a 08.08.2008 às 23:23
É bom saber que lhe agradou o blog, mas é ainda melhor conhecer corações tão generosos
é-lhe grata a Maria José Rijo
De Flor do Cardo a 07.08.2008 às 11:20
Gostei, gostei imenso e devo dizer-lhe que este
texto fazia parte das minhas recordações - de
textos seus.
Com o Ernesto ainda rimos por este
"Raio de tempo dum sacana" - Oh como nos rimos,
caiu-nos no gôto - como se costuma dizer.
Realmente a minha Amiga sempre Escreveu e
continua a escrever MUITO BEM.
Este blog é a prova das minhas palavras e devo
dizer-lhe que este reavivar textos antigos - as
suas A la minutes - são para mim uma alegria.
De verdade que sim.
Ainda bem.
Um grande abraço
Luciano
De Maria José a 09.08.2008 às 00:06
Para falar verdade, eu acho que se nos pusessemos a falar de Elvas a conversa não teria fim.
Às vezes, muitas vezes esqueço-me de coisas que gostaria de ter contado ou dito, mas, pelo menos que fique exressa a vontade de nunca perder o contacto convosco e a certeza de que só algum cansaço fisico me inibe por vezes de vos falar. Fico aflita se não consigo corresponder a todos e, então, se me falta tempo ou estou cansada, opto pelo silêncio.
Hoje, estou de folga do jornal... então aproveito.
Meu marido, também se riu bastante com este texto.
Tanto ele, como eu, como qualquer alentejano genuino, sabemos que alguns palavrões, são no nosso lexico parte da fala castiça, nunca ofensa , grosseria ou obscenidade.
Num clima e paisagem como os nossos a força de expressão não se compadece com palavras suaves, tem que ser palavrões para se atingir a quase violência com que se exprimem os sentimentos e a natureza envolvente - como sabe.
Coisas do nosso Alentejo, que, como é evidente, se sabem, se contam, se entendem, mas não usamos, como é lógico.
Tenho a impressão,que muito me alegra, de que o meu amigo Luciano anda mais distraido, ou talvez esteja mais adaptado ao Brasil.
Alguns dos meus sobrinhos e sobrinhas montavam ou ainda montam a cavalo. daí que o gosto pela equitação do Gilio ainda o torne"mais" meu sobrinho, e que eu pense que também ele tenha direito a um "napoleâo"...
Desta vez, não me quero esquecer que Aristeu me prometeu uma fotografia de família.
Cadê ela?
Beijinhos para os quatro - Maria José
De Fisga a 07.08.2008 às 15:33
De Maria José a 09.08.2008 às 00:17
é portugues
não é alentejano - se o fora, ter-se- ia dado conta de que a expressão que usou é perjurativa enquanto que a do Maioral, não é!
Subtilezas das falas do Alentejo...
Obrigada pela visita. Bom fim de semana
com amizade e apreço - Maria José
De Fisga a 09.08.2008 às 19:29
De Maria José a 12.08.2008 às 00:31
Infelizmente nem sempre conseguimos entender ou ser entendidos embora nos esforcemos por isso.
Assim aconteceu agora.
Jamais quis magoa-lo- creia.
Com a maior simpatia
maria José
De Fisga a 12.08.2008 às 17:46
Para certas sensibilidades, e que eu entendo que elas existem e penso que até entendo porquê. É porque os alentejanos sabem que o Alentejo tem algo a mostrar e a dizer ao mundo e não só aos portugueses, E eles alentejanos, sabem que não lhes é dado o respeito que lhes é devido. Um abraço. E mais uma vez as minhas desculpas, para a senhora e para todo o povo Alentejano.
De Martim Machado a 07.08.2008 às 15:38
acabei de encontrar este seu blog e devo dizer
que estou muito contente por ter o prazer de ler
bons textos como estes seus.
Os meus Parabéns
Martim MAchado
De Maria José a 09.08.2008 às 00:21
Um abraço Maria José
De Luis Carlos Presti a 07.08.2008 às 18:53
De longe, envio muitos beijinhos e desejos de
que tudo esteja bem consigo.
Estou no Tibet e estou maravilhado.
Muitos beijinhos
Seu sobrinho que a adora
Luis carlos Presti
De Maria José a 09.08.2008 às 01:09
Beijinhos tia zé